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Praça Rosa Alves da Silva, em 2020, após revitalização.
Carol Rocha / Subprefeitura Vila Mariana
A troca de grama natural por sintética na praça Rosa Alves da Silva, localizada na Vila Mariana, na Zona Sul de São Paulo, gerou protestos entre moradores e um debate sobre o uso do espaço público e possíveis danos ao meio ambiente.
A obra faz parte de um projeto de revitalização da Subprefeitura, e prevê a instalação de um campo sintético de rugby em área atualmente ocupada por um “campão” — uma mistura de gramado natural e terra batida — utilizado para lazer, atividades esportivas e circulação de animais domésticos.
Segundo os moradores, não houve comunicação prévia sobre a substituição do gramado e o campo poderá restringir o uso coletivo do espaço, além de trazer riscos ambientais como aumento de temperatura, impermeabilização e contaminação por microplásticos.
A praça está localizada na Rua Machado de Assis, quase na divisa entre a Vila Mariana e o bairro da Aclimação. O local, que tem mais de 13 mil m², já abrigou uma garagem da antiga Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC).
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Um grupo organizou um protesto na segunda-feira (15) e conseguiu suspender o início da obra. A comunidade da praça reuniu cerca de 2 mil assinaturas em um abaixo-assinado contra a instalação do sintético e acionou o Conselho Participativo Municipal, o Conselho Regional de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz (Cades) e vereadores — que também não estão de acordo com o projeto.
“A gente fez um protesto no dia que chegaram as escavadeiras, a gente ficou lá”, contou Lina Ceschin, moradora da região e contrária à obra. “O grupo só saiu quando a gente tinha certeza que a obra não ia acontecer.”
Segundo a Prefeitura de São Paulo, o orçamento da obra completa é de R$ 4.489.504,22. Nesta sexta-feira (19), porém, a empresa responsável pela reforça pediu mais R$ 1 milhão para iniciar as obras. Em um ofício, ela apresentou justificativas e documentos, e a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) concordou com esse pedido. O valor total agora é de R$ 5.588.004,16.
A Prefeitura não informou quando as obras serão realizadas.
Imagem do ‘campão’ feita na última segunda-feira (15).
Arquivo pessoal
Ilha de calor
De acordo com o botânico e arquiteto paisagista Ricardo Cardim, a instalação de grama sintética pode transformar o espaço em uma ilha de calor e liberar microplásticos no solo e na água. Ele afirma ser contrário a instalações deste tipo.
“Eu não gosto de grama sintética para nada, porque tem inclusive trabalhos que falam da toxicidade dessas borrachas usadas nessas gramas sintéticas. Elas são ilhas de calor, acumulam uma temperatura altíssima, pode chegar a 70°C no sol.”
O botânico reconhece que a grama sintética pode oferecer desempenho esportivo e praticidade, mas afirma que os possíveis benefícios não compensam os impactos ambientais e de uso, como calor excessivo, falta de permeabilidade e risco de queimaduras.
Ele defende alternativas mais sustentáveis, como pisos permeáveis, e lembra que campos de terra e gramados naturais, como os de futebol de várzea nas periferias, já atendem bem ao esporte.
“A grama sintética tem qualidade e desempenho, mas, por outro lado, há toda a problemática ambiental e o calor que pode queimar crianças. Eu acho que é possível conciliar, mas realmente sou contra a grama sintética por tudo isso.”
“Você vai em Paris, na Champs-Élysées, por exemplo, que é a avenida símbolo da cidade, você tem um piso constituído por areia, com pedrinhas, sobre a terra, permeável. Eles fazem um tipo de aglomeração, de compactação ali, que o piso fica super funcional mesmo com aqueles milhares de turistas andando em cima. E você tem essa naturalidade, essa biofilia, essa absorção de água, que é muito interessante.”
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Em nota, a Subprefeitura da Vila Mariana afirmou que a requalificação da praça “prevê a substituição do gramado do campo por grama sintética, implantação de uma nova rede de drenagem, reforma do parcão e da ATI (Academia da Terceira Idade), bem como a instalação de um parquinho sensorial voltado à primeira infância” (leia íntegra abaixo).
Uso coletivo e restrições
A praça é utilizada por diversos grupos, incluindo moradores, donos de pets, jogadores de futebol e atletas de rugby. Segundo a moradora Lina Ceschin, o local abriga duas nascentes e possui uso compartilhado há anos. Ela afirma que o projeto pode proibir a circulação de animais e limitar o acesso de frequentadores.
“Todos convivem muito bem e é um ecossistema que funciona muito bem”, afirma Lina. “Grama sintética corta, queima e ela precisa ser resfriada para todo o uso. Mesmo com uma drenagem muito correta, cai um absurdo de microplástico na rede fluvial.”
Os moradores apontam que a federação de rugby poderia assumir a gestão do campo, podendo restringir o uso por outros grupos.
Procurada, a Federação Paulista de Rugby (FPR) não respondeu sobre as tratativas com a Prefeitura de São Paulo sobre o uso da praça até a última atualização desta reportagem.
Segundo os moradores, a Subprefeitura teria afirmado ainda que a Vila Mariana não apresenta histórico de alagamentos. Após a declaração, no início de dezembro, a praça registrou alagamento em dia de chuva forte, segundo relatos.
A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), no entanto, afirmou que o entorno da praça não apresenta histórico de alagamento e que a Vila Mariana conta com “39 jardins de chuva, que funcionam como reservatórios para a captação de águas pluviais, contribuindo para a infiltração da água no lençol freático”.
O que diz a Prefeitura
Leia nota da Subprefeitura da Vila Mariana na íntegra:
“A Subprefeitura Vila Mariana informa que a Praça Rosa Alves da Silva permanecerá, após a obra de revitalização, sendo um espaço público de amplo acesso à população. As intervenções vão diversificar as atividades oferecidas, alcançando novos públicos e sem prejuízo à prática das demais modalidades esportivas já existentes no local. A requalificação prevê também a substituição do gramado do campo por grama sintética, implantação de uma nova rede de drenagem, reforma do parcão e da ATI (Academia da Terceira Idade), bem como a instalação de um parquinho sensorial voltado à primeira infância, com o objetivo de estimular o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças.
A Subprefeitura Vila Mariana ressalta que a Praça Rosa Alves da Silva e seu entorno não apresentam histórico de alagamentos. O território da Vila Mariana conta com 39 jardins de chuva, que funcionam como reservatórios para a captação de águas pluviais, contribuindo para a infiltração da água no lençol freático. Cada jardim de chuva possui até 1,5 metro de profundidade e é composto por três camadas: um poço de infiltração de um metro, uma estrutura formada por rachão, brita, terra e composto orgânico, além de plantas e flores responsáveis pela absorção da água.”