Published
2 meses agoon
By
O colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) absolveu, nesta terça-feira (2), por unanimidade, a KPMG e o responsável técnico João Alberto Dias Panceri em caso que os acusava de supostas falhas na auditoria das demonstrações financeiras de 2016 da Copel. O processo, aberto em 2021, envolve a usina termelétrica UEG Araucária (Uega), antiga sociedade da Copel com a Petrobras, que investia no Fundo Osasco.
Confira os resultados e indicadores de Petrobras, Copel, Bradesco e das demais companhias de capital aberto no portal Valor Empresas 360
Esse fundo tinha como principal ativo um empreendimento imobiliário de R$ 430 milhões, posteriormente considerado superavaliado. Em 2017, a Copel reapresentou os balanços de 2016 e 2017 com provisão de perda de R$ 137 milhões, o que motivou a investigação da CVM.
Em 2023, a Copel vendeu, junto com a Petrobras, sua participação na UEG Araucária para a Âmbar, do grupo J&F. A elétrica paranaense, que ainda não havia sido privatizada, detinha 81,2% e a petroleira, 18,8%. Apesar da venda, os passivos seguiram com as antigas sócias.
As falhas começaram a ser descobertas em 2017 pela própria Copel, quando a companhia fechava o balanço trimestral. A companhia verificou que quase metade dos R$ 221 milhões que a Uega havia registrado como aplicações financeiras de liquidez imediata (que poderiam ser resgatadas a qualquer momento) não estava disponível para uso.
Na apuração, a Copel constatou que parte desse dinheiro tinha sido direcionada a um fundo imobiliário, o Osasco Properties FII. Esse fundo era sócio da empresa GBX Tietê II Empreendimentos e Participações, responsável por um grande projeto imobiliário em Osasco, na região metropolitana de São Paulo. Na prática, em vez de aplicações financeiras líquidas, a Copel havia se tornado indiretamente sócia de um empreendimento imobiliário de alto risco.
A área técnica da autarquia acusou a KPMG de não realizar procedimentos suficientes para identificar riscos relevantes ligados ao investimento da Uega. Entre os pontos apontados, estão a ausência de registros detalhados das indagações feitas à administração da Copel e falha nos testes de controles internos sobre mensuração e divulgação de investimentos.
A acusação aponta ainda a classificação da Uega como “não significativa”, o que a excluiu de auditorias específicas, e falta de procedimentos adicionais que poderiam indicar irregularidades. Para a acusação, a KPMG subestimou a materialidade do investimento da UEGA, de cerca de R$ 112 milhões, o que teria comprometido a análise dos riscos do grupo e levado à possibilidade de opinião de auditoria indevida.
No julgamento, a defesa argumentou que, na auditoria do Grupo Copel, a UEG Araucária foi analisada, mas considerada “um componente não significativo da auditoria”, uma vez que tinha apenas 0,39% dos ativos consolidados — muito abaixo da materialidade definida de R$ 140 milhões, que é o limite a partir do qual uma empresa ou operação passa a ser relevante.
“Não havia obrigatoriedade nem necessidade de se realizar procedimentos de auditoria específicos sobre essa companhia”, afirmou o advogado Luis Claudio Furtado Faria, sócio do Pinheiro Neto Advogados.
A defesa também sustentou que as acusações se baseiam em “viés retrospectivo”, já que as inconsistências só foram descobertas em 2017, após investigação interna da própria Copel. A KPMG diz ter feito mais de 17 indagações formais e dezenas de testes de controles internos, devidamente registrados.
O relator João Accioly votou pela absolvição da KPMG e do responsável técnico, por entender que não houve descumprimento das normas contábeis nas quais a acusação se baseou. No entendimento do diretor, em linha com o exposto pela defesa, o investimento da Uega estava abaixo do limite de materialidade, de modo que não havia sinais de alerta que justificassem medidas adicionais.
Accioly criticou, porém, o argumento de “viés retrospectivo” usado pela defesa, ao destacar que esse argumento pode ser aplicado em excesso. “Em princípio, nada impede que a ocorrência de algo imprevisível, associado a um viés de retrospectiva de achar que o evento ocorreu por falha nos procedimentos, motive uma investigação e que daí nasça uma acusação procedente”, afirmou.
A diretora Marina Coppola acompanhou o voto do relator e considerou que os auditores atuaram de forma diligente e adequada às informações disponíveis. Ela explicou que não é possível responsabilizar os auditores por distorções em subsidiárias nem presumir que tinham ciência de irregularidades apenas por auditarem a entidade.
Último a votar, o presidente interino Otto Lobo acompanhou o voto de Accioly e as considerações de Copola. Procurados, a KMPG e a defesa não responderam até esta publicação. O espaço segue aberto.
A CVM abriu outros processos relacionados aos investimentos da Uega no Fundo Osasco. Em um deles, cujo julgamento foi iniciado em junho deste ano e finalizado em 19 de agosto, o colegiado absolveu por unanimidade os acusados, a BDO RCS Auditores Independentes SS e Alfredo Ferreira Marques Filho.
Outro processo, aberto em 2024, ainda não foi a julgamento. Conforme antecipou o Valor em maio, este processo acusa a BEM Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM), que pertence ao Bradesco, as gestoras More Invest e Cadence, além de executivos ligados às instituições, por supostas irregularidades na administração de investimentos da Uega.